Segundo Janine, o luxo não tem valor moral e essa busca por algo que não tem valor moral, mas sim prazer, se torna um ponto importante no conflito social no Brasil e no mundo
Na sequência de sua série de comentários sobre as desigualdades sociais, Renato Janine Ribeiro analisa a relação entre o luxo e a miséria. De acordo com ele, o luxo está sempre ligado a uma posição social mais elevada, supõe, de alguma forma, que uma pessoa se distinga dos outros, até mesmo se apresente como superior aos outros, “porque tem um nível de consumo maior, chamado consumo suntuário, isto é, algo suntuoso, algo que se exibe, algo que se ostenta”.
Esse conceito remete ao que ocorria nas cortes europeias já a partir do século 15, chegando ao seu apogeu com Luiz XIV, o Rei Sol, que chama toda nobreza para viver perto dele no Palácio de Versalhes e assim priva essa nobreza da sua base nas províncias, onde tinham os castelos e seus vassalos, para que todos fiquem felizes só de estar junto do Rei Sol
. Para o colunista, essa ideia continua presente hoje, “quando a gente vê um programa de celebridades como o BBB, vê revistas de celebridades, quando a gente vê o Instagram, a gente constata toda essa exibição de algum nível de vida, que significa que essa pessoa está acima do ‘reino das necessidades’, quer dizer, essa pessoa não tem que lutar no dia a dia, não tem que batalhar para comer, batalhar para ter casa, batalhar para dar escola para os filhos, não tem que fazer isso, essa pessoa está navegando realmente no prazer”.
O luxo é extremamente agressivo para quem está na miséria, afirma Janine. “Nós estamos numa sociedade em que o consumo é tão idolatrado, constitui tanto uma marca de superioridade ou mesmo de dignidade para as pessoas, que elas acabam roubando, matando mesmo, para ter esse elemento de luxo […] nós estamos numa situação em que esse desejo daquilo que não é necessário, daquilo que não é comida, moradia, educação, saúde, transporte, esse desejo começa a ser extremamente vital para as pessoas se distinguirem umas das outras; e, claro, isso traz conflitos
porque é muito mais lógico, por estranho que pareça, uma pessoa pobre aceitar que um outro tenha necessidade da qual ele pobre está privado do que aceitar que o outro tenha o luxo do qual ele está privado, porque o luxo não tem valor moral, a casa, a saúde, tudo tem valor moral. Essa busca por aquilo que não tem valor moral, mas é prazeroso, se torna um ponto importante no conflito social no Brasil e no mundo”.